A administração pública tem o dever de proceder com a contratação de seus agentes por intermédio da realização de concurso público, conforme expressamente previsto no artigo 37 inciso II da Constituição Federal, ressalvadas algumas exceções.
Uma das exceções é aquela em que garante que a união, os estados e municípios, possam contratar temporariamente funcionários, de forma excepcional, em virtude de relevante interesse público (inciso IX do artigo 37).
Em decorrência do regime jurídico especial, muitos direitos dos trabalhadores contratados são suprimidos, sendo um destes o depósito mensal do FGTS. É o que ocorre, por exemplo, com médicos, enfermeiros, professores e etc.
De fato, a contratação temporária não é ilegal e o não pagamento do FGTS também. Porém, em muitos casos a administração pública, desvirtuando o propósito da excepcionalidade conferida pela lei sob o termo “Interesse Público”, vem contratando de forma temporária servidores de forma recorrente, isto é, sem o devido caráter temporário normatizado pela lei, com a nítida intenção de não garantir a referidos colaboradores o pagamento de direitos trabalhistas, incluso aqui o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.
Um exemplo prático e clássico que podemos pontuar é o professor contratado de forma temporária pela rede municipal e rede estadual de ensino. A prefeitura e o governo do Estado, com a intuição de diminuir os custos da gestão pública, não procede com a realização de concurso público para a contração de referidos profissionais, e, além disso, utilizando-se indevidamente da lei, contrata referidos profissionais ano após ano de forma recorrente.
Ou seja, os “temporários”, além de não possuírem a estabilidade dos professores concursados, regidos pelo regime jurídico próprio do ente ao qual estão vinculados, ainda não possuem sequer a garantia do depósito do FGTS, mesmo quando a situação do caso concreto demonstrar incisivamente a inexistência do real interesse público arguido no momento da contratação.
Desta forma, conclui-se que muitos estados e municípios e a própria união não vêm procedendo com a recolha do depósito mensal do FGTS dos temporários, o que configura grave irregularidade e supressão de direitos trabalhistas quando constatada a infringência da excepcionalidade abarcada pela lei.
A jurisprudência do STF é categórica ao reconhecer a nulidade de contratos temporários reiterados de forma sucessiva, razão pela qual considerou devido o pagamento do FGTS para referidos trabalhadores:
CONSTITUCIONAL E TRABALHO. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA SEM CONCURSO. NULIDADE. EFEITOS JURÍDICOS ADMISSÍVEIS EM RELAÇÃO A EMPREGADOS: PAGAMENTO DE SALDO SALARIAL E LEVANTAMENTO DE FGTS ( RE 596.478 – REPERCUSSÃO GERAL). INEXIGIBILIDADE DE OUTRAS VERBAS, MESMO A TÍTULO INDENIZATÓRIO. 1. Conforme reiteradamente afirmado pelo Supremo Tribunal Federal, a Constituição de 1988 reprova severamente as contratações de pessoal pela Administração Pública sem a observância das normas referentes à indispensabilidade da prévia aprovação em concurso público, cominando a sua nulidade e impondo sanções à autoridade responsável ( CF, art. 37, § 2º). 2. No que se refere a empregados, essas contratações ilegítimas não geram quaisquer efeitos jurídicos válidos, a não ser o direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/90, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS. 3. Recurso extraordinário desprovido. ( RE 705140, Relator (a): TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 28/08/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-217 . DIVULG 04-11-2014. PUBLIC 05-11-2014 RTJ VOL-00230-01 PP-00646)
Inobstante, em recente julgado, o TJPB reconheceu a nulidade das contratações temporárias sucessivas de uma servidora municipal que já trabalhava como temporária há 10 anos, garantindo assim o depósito do FGTS da trabalhadora em questão, inclusive dos últimos 5 (cinco) anos, observando assim o prazo prescricional:
ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE COBRANÇA. PROCEDÊNCIA PARCIAL. APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA SEM CONCURSO PÚBLICO. NULIDADE DO VÍNCULO. FGTS E SALDO DE SALÁRIO. POSIÇÃO DO STF NO RE Nº 705.140, EM SEDE DE REPERCUSSÃO GERAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO DEVIDA PELO TRABALHO RECURSAL. DESPROVIMENTO DO APELO E DO REEXAME NECESSÁRIO. 1. O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE nº 705.140, em sede de repercussão geral, reconheceu a nulidade das contratações realizadas pelos entes públicos sem a prévia aprovação em concurso público, gerando para os contratados, tão somente, o direito ao saldo de salários e ao FGTS. 2. Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, os honorários advocatícios serão fixados proporcionalmente ao valor da condenação ou proveito econômico, com escalonamento definido nos incisos do § 3º do art. 85. No entanto, em sendo ilíquida, o momento de sua definição ficará postergado à liquidação do julgado, observando-se a majoração de que trata o § 11 do mesmo dispositivo.
Por esta razão, é deve pontuar que os servidores temporários que possuem contratos renovados sucessivamente por um lastro temporal considerável que desvirtue o propósito de excepcionalidade da lei, têm direito ao recolhimento e depósito mensal do FGTS, observado o prazo prescricional de 5 (cinco) com correção aplicada segundo índice oficial.
Assim, se você é servidor temporário e se encaixa em referida situação, sendo, principalmente, professor, médico e enfermeiro, procure um advogado de confiança para mais orientações.